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O vácuo Brasil nos debates globais

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18/03/2018 03h30 – Por: Daniel Martins Silva

No que se refere a temas da governança global, a recente política externa brasileira não parece apresentar um direcionamento estratégico claro. Essa ausência se revela em um contexto já iniciado no segundo governo Dilma Rousseff, limitando a agenda à diplomacia econômica. Após 7 anos sem reuniões de cúpula, o indicativo de um encontro do Fórum de Diálogo Índia-Brasil-África do Sul (IBAS) a ser realizado ainda em 2018 oferece ao Brasil uma janela de oportunidade única.

Uma linha de pragmatismo comercial tem se consolidado na diplomacia do governo Temer. Ao não se candidatar para um assento rotativo no Conselho de Segurança da ONU (CSNU), o Brasil distancia-se de uma opção diplomática tradicional de ativa participação e pressão por reformas naquela instituição. Isso pode implicar em uma ausência dos interesses brasileiros em um dos mais relevantes órgãos deliberativos do mundo até 2033. Enquanto isso, a alta prioridade dada ao acordo Mercosul-União Europeia e até mesmo a tentativa de adesão do Brasil à OCDE sinalizam um engajamento focado em resultados de investimento e comércio.

Apesar de desfavoráveis, limitações orçamentárias impostas diante da crise fiscal e econômica não justificam a redução do ativismo brasileiro em temas políticos internacionais. A apatia brasileira não prejudica apenas o andamento e os resultados das discussões multilaterais, como também gera impactos concretos no âmbito doméstico. Iniciativas já existentes, de baixo custo e alto impacto, como o IBAS, poderiam responder a esse vácuo.

Criado em 2003, o IBAS representa uma inédita articulação entre três países em desenvolvimento que gerou resultados frutíferos em negociações na Organização Mundial da Propriedade Intelectual, Organização Mundial do Comércio e Conselho de Direitos Humanos, além de avanços em cooperação setorial em áreas como ciência e tecnologia, e defesa, até meados 2013. Entre outros fatores, crises políticas e econômicas no Brasil e na África do Sul, bem como o ativismo sul-africano para integrar o BRICS e a tentativa chinesa de subsumir o IBAS, fizeram com que a iniciativa perdesse força e tração política.

Tensões entre os BRICS estão diminuindo a possibilidade de conciliação de interesses na agenda internacional. Temas como reforma do CSNU, terrorismo, descarbonização da economia, guerra na Síria e tensões no mar do sul da China, dentre outros, revelam as complexas sensibilidades existentes entre eles. Outra tendência é a secundarização do grupo BRICS na política externa chinesa, e a priorização de diálogos bilaterais, incluindo uma maior aproximação com os Estados Unidos. Ademais, a crescente presença de investimentos chineses na América Latina e no Brasil reforça uma tendência de reprimarização produtiva. Tais fatores reforçam a ideia de que o BRICS não tem potencial para ser a única ou a principal iniciativa brasileira para temas de governança global.

Nesse momento, revitalizar o IBAS pode ser estratégico. Sobretudo porque as potencialidades são maiores que os entraves de articulação, tendo em vista o compartilhamento de visões comuns sobre seus desafios de desenvolvimento nacional e inserção global. Em 10 anos, a experiência do grupo em diversas frentes, incluindo a criação de um fundo internacional de desenvolvimento (o Fundo IBAS), demonstrou seu enorme poder normativo e capacidade de diálogo com países de menor desenvolvimento relativo. Assim, reinvestir esforços no IBAS traria maior equilíbrio à política externa brasileira e mobilizaria recursos que transcendem temas puramente econômicos.

Camila Amorim Jardim é Pesquisadora-visitante no Research and Information System for Developing Countries (Índia). Doutoranda em Relações Internacionais na PUC-Rio e colaboradora no BRICS Policy Center.

Daniel Martins Silva é Pesquisador-visitante no Research and Information System for Developing Countries (Índia) e colaborador no Centro de Estudos e Articulação da Cooperação Sul-Sul.

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